março 08, 2009

O experimento da prisão

Da mesma maneira que seguir ordens pode levar a coisas terríveis, dar poder a alguém deve ser um dos caminhos mais curtos para corromper essa pessoa.

Um outro experimento universitário incrível foi feito em Stanford e tinha como objetivo estudar os efeitos psicológicos da vida na prisão. Então 18 universitários voluntários foram sorteados ao acaso entre um grupo de nove presos e nove guardas. No depósito do departamento de psicologia da universidade, se criou a prisão.

O experimento foi tão revelador que hoje tem um site próprio, onde uma apresentação de slides reconta todos os acontecimentos. Recomendo muito, mas em uma versão mega reduzida foi assim:

Os presos foram recebidos da mesma maneira que presos reais. Revistados sem roupas, ganharam uniformes iguais, passaram a ser chamados por um número. Os guardas eram livres para fazer o que quisessem a fim de manter a ordem. Nas primeiras horas, ninguém assumia realmente o seu papel e os castigos para os presos que faziam piadinhas ou reclamavam de alguma tarefa era fazer uma série de flexões. No geral, o primeiro dia foi tranquilo.

No segundo, os presos se rebelaram, colocando as camas contra as grades. A partir daí a coisa fica séria. Os guardas disparam extintores de incêndio contra os presos e dominam a situação humilhando e insultando-os. Os guardas começam a usar táticas psicológicas para controlar os presos, além de decidir cada passo da vida deles.

Os incrível é que os presos obedeciam a tudo. A recém no 3° dia, metade deles já se apresentava pelo número e não pelo nome e nenhum jamais chegou para os pesquisadores e disse "olha, isso aqui é só um experimento, vocês não tem poder real nenhum sobre mim e eu estou indo embora". Assim como nenhum guarda pensou "esses presos são apenas estudantes como eu sorteados ao acaso, não posso obrigá-los a limpar os vasos sanitários com as próprias mãos" (um castigo que realmente foi usado). Os pesquisadores ainda haviam descoberto que os guardas aproveitavam as horas do meio da noite, quando achavam que ninguém estava olhando, para se divertir às custas de abusos cada vez mais pornográficos e degradantes. Nem todos guardas eram horríveis, claro. Um terço era rígido, mas apenas seguia as regras. Um terço era amigável. E um terço era hostil e se dedicava a criar novas e mais humilhantes formas de controle.

O saldo do experimento foram quatro presos com crises nervosas e saídas antecipadas, um preso com uma alergia psicossomática e todos absolutamente isolados uns dos outros. Ao final do sexto dia da experiência que deveria durar duas semanas, os pesquisadores decidiram encerrar  antes que todos os presos saíssem de lá aos frangalhos.

O que mais me impressiona nisso é a maneira como o ambiente transformou esses homens. Não apenas o ambiente físico de grades e sujeira, mas também o ambiente simbólico de regras e noções de como guardas e presos devem se comportar, tudo rapidamente interiorizado pelos dois grupos. Me espanta a facilidade com que somos capazes de assumir papéis e nos transformarmos neles.

Afinal, o que faz de nós o que somos? Os garotos não eram presos nem guardas, mas seria difícil negar que eles se transformaram naquilo. Depois de um dia, não estavam mais atuando, eles eram o que tinham determinado ser. Quando um segundo preso teve um ataque nervoso, o pesquisador precisou quase sacudi-lo pelos ombros dizendo "ei, você não é um presidiário, você é um universitário, os guardas também, isso é só um experimento, volte à realidade e vá pra casa".  E então há essa oposição entre quem o garoto era de verdade e o que ele estava sendo de brincadeira, mas a sua vida REAL foi algo tão construído quanto a faz-de-conta. Se tornar um universitário ou se tornar um presidiário são coisas que nos acontecem por um motivo ou outro, mas não são coisas que nós SOMOS. Todos estamos sujeitos a ser preso um dia - mesmo que injustamente por falsa acusação - e nos vermos reduzidos a migalhas. Para mim, o experimento prova o quanto é frágil a nossa identidade

E deixa a pergunta, o que o nosso mundinho comum aqui fora faz com as nossas identidades?  Todo ambiente exerce suas influências e casos extremos dão pistas de como (basta pensar em casos de naufrágios, a queda daquele avião nos alpes, pessoas perdidas na selva, etc). Mas sem dúvida, o ambiente "comum" tem seus efeitos. Quais? O que o espaço urbano, o transporte público, um emprego, uma fila de banco faz com a nossa idéia de quem somos? 

2 comentários:

Anônimo disse...

tem um filme alemão de 2000 e algo trimmmmmassa sobre um caso assim. os atores são ótimos, cenário e fotografia idem. o título é o que me falta, mas só isso. tem no instituto goethe, pra não dizer que não tentei ajudar.
naõ tem nenhuma referência nesse site aí?
procura lá, tu vai gostar, julinha. beijão e até sexta

Eros disse...

O nome do filme é Das Experiment. Realmente é muito bom e foi realmente baseado no experimento de Stanford.

Interessante no experimento não foi só constatar o quanto o meio contribui para condicionar o comportamento, mas sim o quão rapidamente as pessoas no papel de policiais adotaram comportamentos sádicos e de um modo quase compulsivo. Ser bom ou ruim não depende, então, tanto apenas de si?