março 04, 2009

Matar uma pessoa para salvar cinco

A questão do vídeo de ontem é apenas uma entre milhares possíveis e talvez nem esteja tão ligada à moral quanto à intenção. Mas pesquisadores de Harvard decidiram explorar a fundo a maneira como os humanos lidam com a moral e uma das frentes de pesquisa é um questionário online aberto a todos que quiserem participar.

Com perguntas simples, o teste demonstra como nossas crenças podem ser bem mais frágeis do que supomos. Uma questão apresenta o seguinte cenário: John está em uma estação de trem e vê que há um vagão solto correndo pelos trilhos. O vagão está indo em direção a cinco trabalhadores. No outro trilho, há apenas uma pessoa. John está, por acaso, ao lado de uma alavanca que pode mudar a direção dos trilhos e fazer com que o vagão passe por cima de apenas uma pessoa, ao invés de cinco. É aceitável que John mude a direção dos trilhos?

A maioria das pessoas responde que é moralmente aceitável sacrificar uma pessoa para salvar cinco. Porém, alterando-se levemente o cenário, as respostas mudam drasticamente.

De volta a John: ele está na estação de trem e o vagão solto está correndo na direção de cinco pessoas. Ao lado de John, está um homem extremamente gordo que, se jogado nos trilhos, interromperia o trajeto do vagão, matando o homem gordo e salvando os outros cinco. É aceitável que John jogue o homem nos trilhos?

A maioria das pessoas responde que não, ainda que a conclusão seja essencialmente a mesma: sacrificar uma pessoa para salvar cinco.

O mecanismo que nos faz aceitar que John mexa uma alavanca mas não que ele jogue um homem nos trilhos está provavelmente ligado às diferenças entre ação e não-ação e ação direta e indireta. Hélio Schwartsman, ex-colunista da Folha, escreveu (sobre a mesma questão ainda que com outros personagens) que, no primeiro caso, a morte de um inocente foi como um efeito colateral de uma ação - mexer a alavanca - que visava salvar pessoas. Já no segundo caso, a ação - jogar o gordo nos trilhos - visava a morte de uma pessoa que teria o efeito colateral de salvar outras. O colunista escreve:
Estamos aqui, se quisermos, diante da materialização empírica do imperativo categórico kantiano, que nos proíbe de usar seres humanos como meio para obter um fim (mesmo que nobre). Se assim não fosse, um médico estaria livre para capturar um sujeito saudável que passasse diante do pronto-socorro e, arrancando-lhe rins, fígado e coração para transplante, salvar a vida de quatro doentes.
Divertido, não?

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